Na última segunda, adornei meu
cabelo com uma flor branca e coloquei o pé na estrada em companhia do meu
marido pra fazer uma coisa que amo desde bem novinha: ir a um show de rock.
Desta vez não era um show qualquer. Era o show do Paul McCartney, aquele moçinho,
hoje senhor, de feições delicadas. Feições que provavelmente inspiraram a flor
branca que escolhi para o meu cabelo.
O show foi mesmo delicado. Fez o
que eu acho que a música deve fazer: reverberar. Era noite, mas se podia sentir
luz indo e vindo das pessoas. Nessa onda “amorosa”, um amigo tocou no meu
ombro, ao som de “Hey Jude”, e pediu que eu tirasse uma foto dele com o pai.
Meu amigo estava visivelmente emocionado e no canto dos meus ouvidos disse: “tudo
o que eu sei sobre música aprendi com esse cara, que faz cinquenta anos que ama
Beatles”. Foi impossível não ficar com os olhos inundados de lágrimas. Na hora
pensei no meu velho pai, que, desde bem pequena, eu via os olhos marejar ao ouvir
o Chico Buarque cantar Construção. Não é à toa que a frase “morreu na contramão
atrapalhando o tráfego” vez ou outra vem à minha cabeça, às vezes com, às vezes
sem nenhuma conexão com o que estou fazendo ou sentindo. O que faz sentido é
que a frase “morreu na contramão atrapalhando o trafego” casa o com o discurso “vermelhinho”
do meu pai, que mesmo não conseguindo me fazer petista de carteirinha cravou em
mim aquele olhar que procura algum tipo de conforto para os que nunca tiveram
conforto algum e podem morrer na “contramão atrapalhando o tráfego”. Chuto aqui
que o pai do meu amigo, ao ouvir os Beatles pronunciarem “take a sad song and
make it better”, passou tanta emoção ao pequeno filho, que fez dele um homem
que hoje transforma pedra em caminho.
Meu pai, o pai do meu amigo são
aqueles tipos de pais que ocuparam um tamanho bom na vida dos filhos. Porque há
pais que fazem sombra tão gigante nos filhos, que os deixam mesmo a viver em
sombras. Lembro-me agora de Kafka dizendo em Carta ao pai, que seu pai ocupou quase todo o mapa do mundo e que lhe couberam alguns poucos
espaços, nos quais ele mal soube existir. E os pais pequenos paradoxalmente
produzem tão pouca sombra, que deixam seus filhos com a eterna sensação de estarem
à deriva. Assim, pai de tamanho bom é que aquele que deita no mapa junto com o
filho. As sombras que se veem são as de um no outro. Fácil, então, seguirem de
mãos dadas a um show de “rock in roll” pra sentir lá no fundo do coração a
música cantada pelo Paul McCartney, que desconfio também ter tido um pai de bom
tamanho, nem tão grande, nem tão pequeno.
Perfeito Mari! Meu pai também tinha e ainda tem o tamanho certo. Por isso, acho eu, que faz tanta falta.
ResponderExcluirBeijocas e MUITAS saudades
MARI
Nem fala Mari! O seu pai pra mim é aquele médico sonhador, aquele pai que segura a mão do filho de forma forte e serena. Escrevo no presente porque eu me lembro dos olhos azuis dele, ainda muito vivos.
ExcluirO Maurilio eu nao tenho a menor duvida, eh o tamanho exato!!!! Bjs pra vc e pra ele!
ResponderExcluirZu
O curioso é que Flávia, minha irmã, ao ler o post disse que ela sentia o mesmo que eu. Bom, né! Mamãe disse que quando ele leu o post chorou que nem criança!
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